segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

O caminho das letras: beber da fonte

Por Valter Machado da Fonseca
Caro (a) Leitor (a)!
Ao longo deste ano, minhas contribuições ao NEEFICS, na maioria das vezes, veio na forma de uma leitura crítica de temáticas globais, nacionais e regionais. A leitura crítica demanda uma forma de escrever que, muitas vezes, desagrada a muitos e agrada a poucos ou, desagrada a poucos e agrada a muitos. O fato é que sempre tem alguém que fica incomodado com as críticas, tão necessárias, para a compreensão deste mundo: o mundo da modernidade. Fazer uma crítica apropriada a determinadas questões, demanda, em grande parte das vezes, “colocar o dedo na ferida”, “cutucar a onça com vara curta” e falar de muitas coisas feias e desagradáveis. Pois bem, meus caros (as) leitor (as)! Hoje vou poupá-los das coisas desagradáveis que muitas vezes tive que tratar ao longo deste ano. Não só de críticas vive a humanidade. Hoje, vou deixar de lado as críticas e falar de algo extremamente positivo. O assunto que trago, hoje, à baila é, sinceramente, importante e relevante para todos nós de Uberaba e porque não dizer, da região do Triângulo Mineiro, quiçá de todas as Gerais, ou, até mesmo em nível de país.
Recentemente, lancei meu último livro na Biblioteca Pública Municipal Bernardo Guimarães. E foi com imenso prazer e carinho que preparei aquele lançamento. Para mim, assim como para todas as pessoas que estiveram presentes, foi um evento memorável. E, só foi, de fato, extraordinário, devido ao espaço magnífico que é a nossa biblioteca pública. Na ocasião, um dos meus ilustres convidados, o Prof. Mestre e doutorando Serigne Ababacar Cisse BA, natural de Dakar (Senegal) e docente da Universidade Federal de Goiás, Campus Catalão (UFG/Catalão), me chamou a atenção para quão precioso é aquele espaço para a valorização de nossa cultura. Nas palavras dele: “esse é um espaço de dar inveja a muitos países do denominado primeiro mundo”. E ele continuou: “não se trata apenas de um espaço, é um espaço preenchido com um acervo riquíssimo e de valor inestimável”.
Muitas vezes, nós que somos do lugar não temos a dimensão da importância de algo grandioso que construímos. É preciso que alguém, com “o olhar de fora” nos chame à atenção, muitas vezes, para símbolos e aspectos fundamentais de nossa própria cultura. Ainda bem que essas pessoas existem, estão atentas e nos alertam. Depois de minha conversa com o Prof. Serigne, apesar de eu já ter me apercebido da importância do espaço e do acervo de nossa biblioteca, ainda talvez não tivesse a devida dimensão e proporção dessa importância. O fato é que, depois daquele dia, nunca mais eu consegui olhar para aquela biblioteca com o mesmo olhar. Aí pensei: ela é como se fosse uma trilha para a nossa cultura, para a construção de nossa identidade. Ela é o caminho das letras, é a fonte que pode saciar muita gente sedenta de novos conhecimentos, novos aprendizados e saberes.
Mas, aquele espaço não está assim por mero acaso. Ele é o resultado de muito trabalho, da soma de muitos esforços, é o resultado do trabalho de toda uma equipe. Não quero aqui me deter na citação de nomes, pois isto poderia me induzir a erros, equívocos e injustiças. Mas, todos que se empenharam na construção do projeto dessa biblioteca, saberão que, com certeza, o reconhecimento que teço, tem uma parcela para cada um. É uma grande obra, real, construída com a soma de muitas mãos. Ela é uma realidade cujo resultado é a soma de vários fragmentos do sonhos de muitos. Por fim, quero, por intermédio deste singelo artigo, agradecer e prestar uma homenagem especial a todos [direção, funcionários e voluntários] que transformaram um sonho em uma realidade magnífica. Parabéns a todos (as) que construíram o caminho das letras. Portanto, como brinde, vamos todos beber da generosa fonte produtora eterna de novos conhecimentos e saberes.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Lixo: o problema emblemático do século XXI

Por Valter Machado da Fonseca
Há poucos meses atrás, o Brasil foi surpreendido com containers de lixo vindos da Europa e descarregados em nossos portos. É um acontecimento constrangedor, porém emblemático. O fato serviu, como uma luva, para fazer suscitar e revitalizar os debates e as discussões acerca da superprodução de efluentes domésticos e industriais, além de trazer o questionamento sobre o lugar dos países “em desenvolvimento” [ou subdesenvolvidos] diante dos olhos da denominada “sociedade civilizada” ou ocidental. Na verdade, as grandes conferências internacionais que têm “brincado” de debater os grandes e graves problemas socioambientais que tanto assolam e assustam a humanidade, não apontam nenhuma solução séria para a superprodução de efluentes e do lugar que ocupam os países pobres nestes debates. Eu insisto em ligar a produção de efluentes ao papel desempenhado pelas nações pobres, porque acredito que são questões interdependentes e interligadas.
Na verdade, os países pobres sempre se utilizaram e ainda se utilizam do rejeito, da sucata originada da tecnologia em desuso, ultrapassada e já abandonada pelas principais potências capitalistas industrializadas em nível mundial, em especial pelas nações europeias e norte-americanas. Essas potências industriais enxergam os países pobres como locais propícios para depositarem o rejeito de sua tecnologia, juntamente com seus efluentes domésticos e industriais. E, pasmem! Enxergam-nos, inclusive, como depósito de seus resíduos nucleares. Eis porque a questão dos containers europeus foi emblemática.
Por outro lado, ao analisarmos a sociedade do consumo, que para a parcela majoritária dos cientistas é igual à “sociedade do conhecimento”, podemos verificar uma série de conflitos e contradições que envolvem o discurso da superprodução de mercadorias, que justificam o ponto nevrálgico, o epicentro do capitalismo: a mais valia [o lucro]. Hoje, virou modismo os discursos “ecologicamente e politicamente” corretos da coleta seletiva e da reciclagem de resíduos. Não estou dizendo que esta prática é incorreta. O que afirmo é que este discurso, sorrateiramente e estrategicamente, foi apropriado pelos setores mais poluidores da indústria para justificar a superprodução de mercadorias e, consequentemente, maior consumo de recursos naturais, inclusive os “não renováveis”, o que vai gerar mais resíduos. Ironicamente, hoje, quem mais defende o discurso da coleta seletiva e da reciclagem são os setores mais poluidores dos grandes conglomerados agroindustriais. Com isso, eles conseguem a tão cobiçada certificação ambiental, o que vai agregar valores “ecológicos” a seus produtos e, em consequência, promover o aumento de seus já exorbitantes lucros e, ao mesmo tempo justificar o aumento exponencial de sua produção. Se existe quem recicla, podem produzir à vontade. Essa é sua “lógica”.
As grandes questões colocadas para a humanidade são: como frear a superprodução de mercadorias? Como planejar ações sustentáveis numa sociedade que cultua o lucro acima de qualquer outro valor? O que fazer com tanto lixo, cuja produção aumenta, de forma exponencial, à custa de recursos naturais que são potencialmente finitos? De que forma e onde armazenar estes resíduos? Na sociedade da modernidade, além do acúmulo dos efluentes domésticos e industriais mais comuns, verificamos também o aumento desenfreado dos resíduos tóxicos, a exemplo do lixo hospitalar, pilhas e baterias, metais pesados, resíduos nucleares e, até mesmo lixo espacial que viaja em torno do Planeta Terra [rejeitos e sucatas de foguetes, de satélites, de sonares, de radares, etc.]. A grande certeza que temos é que a maior parte desses resíduos possuem destinos certos: irão contaminar as principais fontes de vida no planeta ainda azul, como as águas, os solos, a atmosfera. Com isso, o futuro que nos espera, o planeta já anuncia desde os anos 60, com o aumento das catástrofes, às quais o homem chama de “naturais” como o “Buraco na camada de ozônio” [que felizmente já está sendo controlado], os grandes terremotos, maremotos, tsunamis, as “chuva ácidas”, as grandes enchentes e inundações [vide a chuva de granizo em Uberaba], o aumento da poluição atmosférica, as alterações climáticas, o aparecimento de novas doenças e a volta de antigas, o aquecimento global, dentre outros eventos altamente preocupantes para a humanidade.
Caro (a) Leitor (a)!
Diversas pesquisas apontam para a extinção da espécie humana em apenas mais alguns segundos (em tempo geológico) de existência sobre a face da Terra em decorrência de sua prática destruidora. Após a extinção do homem, a terra, com certeza, se recomporá de uma forma mais saudável, sem a ameaça da existência humana. Aí, a Terra terá conseguido levar a cabo sua reação, terá expulsado de seu organismo, da forma mais dolorosa, o vírus pernicioso da prepotência humana, o grande responsável por suas enfermidades e seu estado febril.

sábado, 4 de dezembro de 2010

Uma humanidade de “não humanos”

Por Valter Machado da Fonseca
Os destaques da mídia nas últimas semanas, em sua imensa maioria, referem-se à disputa territorial entre as Forças Armadas e as facções que controlam a indústria do narcotráfico no conjunto de favelas que compõem o Complexo do Alemão, na cidade do Rio de Janeiro.
Ao analisarmos os acontecimentos na periferia da cidade ainda maravilhosa, ficamos perplexos, pois começamos a refletir acerca da luta do “bem” contra o “mal”, da “solidariedade” contra a “covardia”, enfim da “racionalidade” contra a “irracionalidade”. Na verdade, podemos sintetizar estes episódios como a disputa do Estado brasileiro contra o poder paralelo instalado pelos narcotraficantes nas periferias das grandes e médias cidades brasileiras. Estes episódios refletem a falta do debate, tão necessário, sobre a podridão, o estado de necrose das instituições, que dão sustentação ao Estado brasileiro.
O que estamos presenciando são cenas de barbárie, de terror, de uma autêntica guerra civil no principal ponto turístico do território brasileiro. Presenciamos a troca aberta de tiros e mísseis de armamentos pesados [inclusive uma bazuca] entre o crime organizado e as tropas da PM e do exército brasileiro. E, no meio do fogo cruzado está a população aterrorizada [trabalhadores, homens, mulheres e crianças], enfim pessoas honestas e de bem. Aliás, há quem defenda que na periferia das grandes cidades [nas favelas] só moram bandidos. Grande parte da opinião pública não tem consciência que a imensa maioria da população que habita as favelas é constituída de trabalhadores, marginalizados, segregados sócio e espacialmente, em decorrência da má distribuição de renda, da especulação imobiliária, da falta de empregos e de condições dignas de sobrevivência. Como dizia o saudoso Paulo Freire: são os “demitidos da vida”, “os esfarrapados do mundo”.
O Estado brasileiro, infelizmente, vem adotando uma política de bombeiro, de “apagador de incêndio”. Tardiamente começaram uma ofensiva para tomar o controle do território ocupado pelos narcotraficantes no Rio de Janeiro, não pela vontade de acabar com a violência urbana e restabelecer a paz na periferia. Mas, o fazem porque a imagem do Brasil vem sendo, sistematicamente, bombardeada pela opinião pública mundial e o país vai sediar os dois maiores eventos esportivos do planeta: a copa do mundo de futebol em 2014 e os jogos olímpicos de 2016. Como a cidade maravilhosa é o nosso principal cartão postal é preciso “limpar” os morros cariocas. Não estou aqui tentando dizer que a indústria do narcotráfico não precisa ser destruída, muito pelo contrário, precisa ser desmontada com urgência.
O que defendo é uma ação efetiva, organizada e planejada [que não coloque em risco a vida de pessoas honestas e trabalhadoras], em nível nacional e não ações meramente pontuais. É preciso também varrer do congresso nacional os representantes dos narcotraficantes [que a cada dia mais, vem elegendo um número expressivo de representantes]. É preciso repensar a nossa política carcerária, cada vez mais infiltrada por funcionários do narcotráfico.
Não é preciso irmos longe, basta olharmos para a nossa cidade. Passear pela cidade depois das 23 horas, inclusive pela região central, já se torna um desafio e uma ameaça à nossa própria vida. Enfim, é preciso repensar nossas leis, nossa educação, nosso sistema prisional, nossa polícia. Torna-se urgente e extremamente necessário repensar nossa nação, pois o homem está trocando seus valores morais pela superfluidade da sociedade do consumo. Estamos vivendo um período no qual a perda total dos princípios humanos faz ressurgir das cinzas os tempos bárbaros e cruéis, uma humanidade de “não humanos”.