domingo, 23 de janeiro de 2011

Mas e a vida? E a vida o que é, diga lá meu irmão

Por Valter Machado da Fonseca
Viver e não ter a vergonha de ser feliz. Cantar! Cantar e cantar! A beleza de ser um eterno aprendiz. [...] e a pergunta rola. E a cabeça agita: eu fico com a pureza da resposta das crianças: é a vida, é bonita e é bonita!” (Gonzaguinha).
Ao analisarmos a letra da canção de Luiz Gonzaga Junior, o Gonzaguinha, várias inquietações nos vêm à mente. A canção nos remete a indagações como: por que o brasileiro consegue sobreviver com este salário mínimo? Qual é o jeitinho brasileiro? Por que o brasileiro é tão criativo? Quando nos vêm à mente estas indagações, lembramo-nos das dificuldades pelas quais passa o nosso povo. Lembramo-nos das enchentes que destrói, num piscar de olhos, tudo que famílias inteiras construíram durante todas suas vidas. E, o mais interessante é que eles não desanimam, estão dispostos a recomeçar do zero. Aí, surge a pergunta que sintetiza tudo isso: de onde vem a imensa força de superação de nosso povo?
Mas, para tentarmos entender esse “mistério” é preciso filosofar. Filosofar sobre a vida. Filosofar sobre as concepções de vida e de mundo. Filosofar sobre este modelo de sociedade reducionista. Uma sociedade que reduz “o tudo” ao “quase nada”. Ao analisarmos os discursos dos poderosos, dos chefes de Estado, dos governantes do mundo e da sociedade, observamos que tais discursos são carregados de coisas complexas, de palavras bonitas, de “boas intenções”, de “verdades” supostamente neutras. Mas, se analisarmos as entrelinhas de tais discursos o vazio do “não dito” como diria Michel Foucault, verificamos que, ao contrário do que nos aparenta à primeira vista, eles são encharcados de intenções, de dissimulações, de armadilhas. São discursos reducionistas, que reduzem o importante à superfluidade, a alegria à tristeza, a bondade à maldade, a simplicidade à perversidade, as boas intenções à ruína. Aliás, “de boas intenções o inferno está cheio”.
Na verdade, em nome da felicidade humana, o aparato discursivo dos grandes governantes da humanidade defende, em última instância, a mediocridade da ganância, da mais valia (lucro) e da exploração do homem e do planeta. Para eles, a felicidade se reduz ao lucro dos banqueiros e dos grandes grupos e da exploração do homem pelo próprio homem. Que felicidade é essa, afinal?
Agora, quando analisamos o discurso dos “de baixo”, como diria o nosso saudoso Paulo Freire, dos despossuídos, dos dizimados, dos invadidos, dos “demitidos da vida”, dos “esfarrapados do mundo”, enfim, o discurso do “povão”, verificamos que os parâmetros, os valores são outros. Eles não se preocupam com a complexidade do mundo, mas sim com a simplicidade das coisas do mundo. Eles se preocupam em viver o momento presente e não com projetos mirabolantes para o futuro. A felicidade para o nosso povo se reduz à simplicidade do mundo e das coisas do mundo. Eles se contentam e são felizes com o churrasco na laje nos fins de semana, em curtir o samba, o pagode, em “fazer amor”, não importa a hora. Eles constroem sua cultura nas lacunas do sofrimento do dia a dia, no cotidiano simples de suas vidas. A vida, para eles, é constituída da soma de momentos felizes. É por isso, que eles enfrentam, de peito aberto, o sofrimento e as atrocidades que marcam o cotidiano de suas existências. E, por isso, eles são felizes, mesmo na adversidade. A vida para essas pessoas se resume na simplicidade das coisas mais simples e não na complexidade dos discursos dos opressores. Está é a chave do nosso “mistério”.
Por isso, concordo com o grande Gonzaguinha: ninguém quer a morte, só saúde e sorte. [...] eu fico com a pureza da resposta das crianças! É a vida! E, ela é bonita, é bonita e é bonita! Por isso, o mais importante é viver e não ter a vergonha de ser feliz!

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