sábado, 26 de dezembro de 2009

CONFERÊNCIA DE COPENHAGUE 2009

Foto: fontes de emissão de poluentes para a atmosfera.

COPENHAGUE 2009!
QUE CONFERÊNCIA? QUAL CONFERÊNCIA?
Um balanço geopolítico

Por Valter Machado da Fonseca

1. Introdução
Há poucos dias atrás aconteceu em Copenhague (Dinamarca) a tão esperada conferência mundial do clima. Mas, aqui cabe a pergunta: Que conferência? Qual conferência? Sim! A ironia é necessária, uma vez que supostamente teríamos uma conferência mundial para debater o grande problema das alterações climáticas. Porém, o que se viu em Copenhague foi um circo montado para uma demarcação de posições políticas, uma demonstração de poder político e econômico. Mas, que tipo de poder? O poder pernicioso do discurso enganoso, vazio, obscuro, supérfluo, porém cheio de promessas vagas e superficiais para um futuro incerto e nebuloso.

O mundo inteiro esperava pela tão propalada conferência de Copenhague. O mundo todo esperava ouvir dos chefes de estado, presentes no tão esperado evento, propostas que visassem, pelo menos, minimizar os graves problemas ambientais que angustiam toda a humanidade neste limiar de século XXI. O planeta todo esperava ouvir dos grandes dirigentes das diversas nações, que eles estão de fato preocupados com o futuro da Terra e da humanidade e, que apresentariam propostas palpáveis e executáveis para enfrentar esta importante problemática.

Todos os povos [e quando digo povos não me refiro aos governantes] esperavam que os dirigentes das mais diversas nações tivessem a dignidade e a humildade de se despir da arrogância advinda da ganância pelo lucro a qualquer custo, em detrimento de recuperar a saúde ambiental do planeta. Que deixariam de lado a luxúria, a ostentação e a hipocrisia e, pelo menos uma vez na vida, abandonassem suas vaidades pessoais, o jogo do poder, para dizer ao mundo que, como dirigentes, têm responsabilidades com os destinos da humanidade e com o futuro da Terra e das gerações futuras.

Mas que nada! O que o mundo viu foi um discurso truncado, cheio de armadilhas, carregado de hipocrisia e que, no fim das contas, visava a atender somente os anseios do lucro dos grandes grupos e conglomerados inter/multi/transnacionais. O que se assistiu foi um discurso leviano que reafirmava o poder dos ricos sobre os pobres, que reafirmava a linha que traça a divisória do abismo que separa os países pobres do hemisfério sul, dos países ricos do hemisfério norte. Aí fica uma pergunta: o que os países africanos foram fazer nesta conferência? O que os países da Ásia Central foram fazer nesta conferência? O que os países da América Latina foram fazer lá? Foram justificar o discurso dos países ricos? A resposta é: sim! Foram fazer exatamente isso.

2.1 Qual a contribuição dos EUA e da União Europeia no debate do clima?
Que nada! O que o mundo presenciou foi a prepotência dos EUA tentarem, desesperadamente, recuperar o lugar de destaque outrora conquistado pelo dólar [e os petrodólares], o discurso aflito e ausente, miúdo e caquético de Barack Obama tentando recuperar seu lugar perdido de grande líder mundial. O que o povo viu foi a figura desesperada de uma chefe de Estado norteamericano, totalmente aturdido e ainda abalado pela crise econômica mundial do capitalismo, tentando resgatar seu lugar de principal dirigente da economia mundial.

O que a população de todo o planeta viu foi uma Europa, carcomida, falida, sem nenhum discurso, sem nada a dizer, suplicar, reclamar seu lugar também outrora perdido, de “centro do universo”. Uma Europa que destroçou seus próprios recursos naturais, com uma política de “olhar para o próprio umbigo”, de não saber, jamais, o significado da palavra “planejamento industrial e urbanoambiental”.

Dois polos: EUA e União Europeia, que mostraram, mais uma vez, total incompetência para gerir os recursos do planeta e os destinos da humanidade. Que mostraram que nunca estiveram preparados para assumirem posições de liderança perante o conjunto dos povos do mundo. Dois polos que já demonstram não possuir nenhum discurso que tenha qualquer conteúdo relativo à responsabilidade socioambiental.

2.2 E a China?
A República Popular da China foi o terceiro polo do evento mundial. Considerada uma nação “emergente”, um país que tem seu desenvolvimento econômico calcado na total ausência de quaisquer formas de planejamento urbanoindustrial, a China cresce devorando seus recursos naturais nos moldes das demais nações capitalistas. É considerada, hoje, um dos principais polos de emissão de poluentes para a atmosfera.
Nesta conferência, a China foi duplamente atacada: pelos EUA e pela União Europeia. Apesar das acusações contra a nação chinesa terem como eixo da argumentação o aumento dos gases estufa emitido por ela, esse pretexto visava, principalmente, eliminar sua constante ameaça à supremacia política e econômica dos dois blocos supracitados. A questão da emissão de poluentes para a atmosfera serve, perfeitamente, de pretexto para frear seu processo de crescimento industrial, o que eliminaria a ameaça às supremacias político-econômicas dos EUA e da UE.

Isto vem expor, por completo, a essência das discussões e dos debates que marcaram o evento: o eixo das discussões foi desviado para as disputas geoeconômicas e não para os debates em torno das ações objetivando combater o problema do aquecimento global.

2.3 E os países pobres ou [como prefere a maioria dos estudiosos] países em desenvolvimento?
Esses assumiram atitudes frágeis, inconsistentes, débeis, covardes até, tentando, desesperadamente um lugar, junto a um desses dois polos. Na verdade, os discursos dos governantes dessas nações eram os mais esperados, pois, traziam aquele fio de esperança quanto aos destinos do planeta. Nada disso aconteceu! Os discursos dessas nações serviram, exatamente, para reafirmar as posições dos países ricos, para justificar seus discursos obscuros, ardilosos, vazios.

Isto ficou claro no pronunciamento da delegação brasileira que, num tom abaixo, foi uma reprodução fiel do discurso de Obama. A fala do dirigente brasileiro fez parecer que sua tarefa era chefiar sua delegação numa expedição ao “muro das lamentações” [com todo o respeito à fé muçulmana]. Aliás, o discurso brasileiro na conferência foi orquestrado, de um lado pelo presidente francês [porta voz da União Europeia] Nicolas Sarcozy e de outro por Barack Obama [porta voz norteamericano]. O Brasil se negou a assumir seu papel de líder do bloco dos países pobres, “em desenvolvimento”, não os convocando à unidade de ação no encontro.
A participação desses países foi covarde e submissa. Faltou coragem e ousadia para reivindicar, debater em pé de igualdade com os ricos. Faltou rebeldia para se fazerem ouvir, para dizer que não estão dispostos a tolerar mais o descaso para com a gestão dos recursos naturais. Faltou ousadia para bradar, em alto e bom som, que não aceitam mais em seu território os rejeitos [lixo] de uma sociedade carcomida e decadente. Que podem levar, de volta, seus containers, que não vão gerir resíduos, mas sim os recursos naturais que eles [os ricos] estão cobiçando há muito tempo.

Faltou coesão, unidade em seu discurso. Não atuaram em prol de uma plataforma de ação que estabelecesse metas e construíssem propostas unificadas para fazer cumprir a verdadeira pauta do evento. Pode-se dizer que os países pobres perderam uma excelente oportunidade de unificar seus discursos, reivindicações e propostas dentro do modelo proposto de desenvolvimento sustentável. Foram a reboque do discurso dos blocos econômicos representantes dos países ricos e que mais poluem a atmosfera terrestre. Enfim, nesta conferência (?), mais uma vez, perderam o “bonde da história”.

3. O que se tirou de objetivo? De concreto? De prático?
Nada! Absolutamente nada! O que fora construído nas conferências anteriores, o que restava do Protocolo de Kyoto foi rasgado em público pelos países ricos e jogado no lixo pelos países “em desenvolvimento”. Nenhuma meta decisiva para a redução de poluentes foi construída. Nenhuma ação prática de responsabilidade socioambiental foi edificada. Nada se fixou em relação às queimadas e desmatamentos. Nenhum prazo foi estipulado. Nem parecia que o tema central do evento eram as alterações climáticas.
O que se sabe é que cifras astronômicas foram gastas [jogadas fora] com a preparação da conferência tão esperada. Do que aconteceu nos bastidores do evento, nada se sabe apenas se imagina. O que se pode dizer, com toda certeza, é que tudo se debateu, exceto as problemáticas socioambientais, em especial as alterações climáticas, que foram deixadas para segundo plano.
4. E agora, o que fazer?
Os resultados da conferência não apontaram nada de concreto, nenhum fio de esperança foi tecido. Nas entrelinhas dos discursos dos principais chefes de Estado, o que se pode perceber foi a falta de compromisso, de responsabilidade para com os graves problemas socioambientais que tanto angustiam a humanidade neste início de século.
Pode-se perceber que os dirigentes mundiais não estão nada preocupados com tais problemas, mas extremamente preocupados em manter suas regalias, seu poderio bélico, político e econômico. Que eles trocam e trocarão, sempre, a saúde ambiental do planeta pela mais valia, não importando com as consequências dessa opção. Que não possuem nenhuma proposta para quaisquer formas de planejamento socioambiental, muito menos para a diminuição de poluentes para a atmosfera.

4.1 Qual a esperança daqui em diante?
Por incrível que pareça, existe um fio de esperança. E esta esperança está nas mãos da população mundial, nas mãos do povo. Na verdade, a única forma que restou para se debater as grandes questões ambientais da atualidade passa, exatamente, pela participação direta das populações das diversas nações do mundo.

Se os governos não estão preocupados, o povo está. Só a organização popular, cientistas, estudantes, professores, universidades, movimentos sociais, sociedade civil organizada, possuem o poder de pressionar esses governantes, para que assumam suas responsabilidades em relação aos graves problemas socioambientais da sociedade moderna. Só esses setores podem exigir que os governantes abandonem o discurso superficial e vazio, que abandonem a hipocrisia e a covardia e assumam atitudes corajosas, para fazer valer as funções inerentes aos cargos que seus povos lhes confiaram.

Neste sentido, a organização e pressão populares são fundamentais para que se saia do impasse gerado, principalmente a partir desta conferência. A partir das mobilizações organizadas desde a base, torna-se possível traçar ações práticas e efetivas visando à minimização dos impactos socioambientais que colocam em risco a saúde ambiental do planeta e a continuidade da existência da espécie humana.

5. Como fazer o balanço de algo que nada discutiu, que apontou para o vazio?
O balanço do evento de Copenhague leva a duras e terríveis reflexões. A situação ambiental do planeta está à mercê de especulações paliativas e superficiais, muito próximas dos anseios e do lucro das grandes corporações multi/transnacionais e muito distantes dos anseios e bem estar das populações, de se apresentarem enquanto propostas práticas e concretas para superar os problemas e os desafios socioambientais da atualidade. O rescaldo do encontro de Copenhague foi extremamente negativo.
Um fracasso!Um desastre! Uma decepção! Um fiasco! Essas expressões traduzem bem o que foi a Conferência de Copenhague. O que podemos concluir é que o evento não existiu, mas os problemas existem, o aquecimento global é um fato real, e como tal deve ser combatido. A solução para os problemas socioambientais da sociedade moderna exige ações políticas, mudanças de comportamento, ações que levem a um efetivo planejamento industrial e urbanoambiental global.

Se a Conferência Mundial de Copenhague não apontou nenhuma solução, a ação política passa a ser uma responsabilidade dos diversos setores organizados da sociedade. Portanto, agora é nossa a tarefa de chamar este debate, é tarefa das escolas, dos educadores, universidades, estudantes, movimentos sociais, cientistas, enfim, dos diversos setores da sociedade organizada tomar nas mãos os desafios de construir ações locais/globais e globais/locais, visando à minimização dos graves problemas socioambientais que tanto angustiam a humanidade, nesse limiar do século XXI. Por fim, podemos afirmar que o encontro de Copenhague de dezembro de 2009, pode ser definido como "A Conferência que nunca existiu".

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