sábado, 14 de agosto de 2010

A ciência e a prática da ciência nas bordas da modernidade: Prefácio livro "O SUJEITO & O OBJETO"

É também com grande orgulho e satisfação que apresentamos o posfácio do livro "O SUJEITO & O OBJETO", de autoria de Valter Machado da Fonseca e Sandra Rodrigues Braga. Este prefácio foi uma gentil contribuição do Prof. PhD. Humberto Guido, docente do Programa de Mestrado/Doutorado da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Uberlândia (PPGED/FACED/UFU).

PREFÁCIO
Por Humberto Guido
O título deste livro remete ao feixe de questões que dão expressão ao modelo de ciência produzido pelos modernos, cuja obra coletiva vem sempre à mente quando se discute os impasses do tempo presente, a devastação do planeta, o envenenamento da mesa (daqueles que a tem), a concentração de riqueza e a disseminação da miséria em escalas jamais constatadas pelos estatísticos. O problema não é etimológico, como se a simples interpretação da palavra ciência pudesse descerrar o mistério do mal que avança sobre a humanidade, tornando plausível a destruição precoce do planeta e com ele todas as formas de vida.
O conteúdo dos capítulos deste livro levará o leitor a entender que a crise não é interpretativa, a pergunta elementar “o que é a ciência afinal?” abordada no primeiro artigo (O DISCURSO HEGEMÔNICO NAS ENTRELINHAS DO SABER) informa que o problema não é semântico, o que se deve discutir é a prática da ciência, uma situação que de saída sugere que o problema ainda não foi captado pelas instituições formadoras de professores: as universidades e os centros de educação superior. A prática da ciência ainda se faz desconhecida para grande parte dos profissionais da educação, seja a básica, seja a superior, e por vezes até mesmo na pós-graduação.
A percepção da realidade não muda apenas com interpretações, é preciso uma nova atitude para o enfrentamento dos velhos problemas, para isso é preciso repensar a formação dos agentes sociais, desde a criança até os professores formadores de professores, esta situação foi destaca por Marx em uma simples afirmação categórica, uma tese em pouco mais de três linhas: “A doutrina materialista sobre a mudança das contingências e da educação se esquece de que tais contingências são mudadas pelos homens e que o próprio educador deve ser educado” . É preciso, portanto, refletir sobre a prática educativa, também nas escolas, pensar sempre! Esta orientação aparece em todos os artigos do livro, com maior intensidade nestes: Degradação ambiental e exclusão social: interfaces de um problema da cidade (e da sala de aula), Globalização, crise da educação e falência da modernidade: notas para uma ação ética na escola, Uma escola para além do capital: o currículo como instrumento de controle ideológico.
Os outros artigos percorrem a mesma via que conduzirá o leitor na discussão da educação ambiental, cuja reflexão contribuirá na elucidação dos impasses epistemológicos e didáticos, que quando ignorados dão oportunidade para a reprodução o modelo pedagógico alienado e distante da prática da ciência contemporânea, o que na maioria das vezes reforça a visão ingênua da ciência como portadora da verdade definitiva para o progresso e prosperidade, de maneira que todo produto da ciência é necessariamente bom e deve ser recebido com aplauso. A educação ambiental é o grande desafio da sociedade capitalista e o seu sistema de ensino.
A leitura dos artigos é oportuna, não apenas pelo alerta dado pelos autores, mas, a contribuição significativa do conjunto de artigos aqui reunidos é a proposição da atitude crítica frente aos problemas gerados pelo modelo de desenvolvimento capitalista, que é sustentado pelo consumo em larga escala e cujo resultado ultrapassa a reprodução das forças de produção. O resultado visível do modelo é a devastação do ambiente, não somente os ecossistemas, o ambiente humano também é contaminado, sendo assim, a educação ambiental é atravessada pelas questões éticas: do indivíduo, do grupo, da sociedade.
A característica marcante dos escritos de Valter Machado da Fonseca e Sandra Rodrigues Braga é a abordagem do problema em sua complexidade, suas análises evitam o imediatismo da leitura de superfície, as ponderações e digressões analíticas escavam a realidade, para deixar visível o cerne dessas questões que se entrelaçam o que inviabiliza a conduta tipicamente positivista de responder aos desafios, porque no velho paradigma o diagnóstico quer insistir na simplicidade das situações-problema, como se a realidade estivesse destituída da multiplicidade que lhe dá forma.
É preciso uma nova atitude educativa, que demanda a mudança de paradigma no âmbito da educação, deixando para trás o ensino formal calcado nos conhecimentos inertes e incapazes de elucidar o mundo. A mudança na esfera da educação uma possibilidade de revisão da prática da ciência, porque não existe a ciência sem o cientista, logo, a ciência é uma prática social, que até o momento esteve submetida ao modelo econômico, mas que pode mudar e fazer mudar o modelo, instaurando em seu lugar uma nova mentalidade, comprometida com a conservação da natureza e igualmente engajada na preservação do humano em harmonia com todas as formas de vida.
Não é por outra razão que o livro se encerra com um ensaio sensível dedicado a Paulo Freire (Paulo Freire e a educação libertadora: Um modelo para a construção de uma nova escola), educador brasileiro cuja teoria alcançou o mundo e pode ser identificada ao lado de outras práxis empenhadas na refutação do autoritarismo científico e da alienação escolar. Com esta certeza, renovo a esperança de que o mundo ainda é viável, que a humanidade ainda pode ser educada.
Boa leitura!

Nenhum comentário:

Postar um comentário